Wednesday, January 16, 2008

Por que existe a ressaca, meu Deus; por que, por que, por quê?

Muito já se escreveu sobre (e sob) a Ressaca. Talvez só perca, no rol dos temas universalmente tratados, para Deus e o Sexo. Conquanto sejam todos esses temas de importância existencial, eu, particularmente, tenho tido muito mais contato com a primeira que com os dois outros.

Lembro de um conto do Luís Fernando Veríssimo (salvo engano) em que ele compendia as ressacas e as classifica de acordo com o tipo de mal-estar. A ressaca de vinho (salvo engano) deixaria o vitimado em tal estado de desidratação que o empurraria no meio da noite para a cozinha, onde ele descobriria desalentado que não há líquido potável e que terá de recorrer, portanto, à gaveta dos legumes, junto à qual seria encontrado na manhã seguinte chupando um chuchu, em busca de umidade. Eu sorri ao ler a crônica, mas foi um sorriso tenso, de quem se dá conta que o abismo moral das crônicas pode estar logo ali, numa madrugada de sábado pra domingo.

Na literatura ressaquística disponível, as seqüelas físicas são as mais incensadas. A sintomatologia clássica inclui dores de cabeça lancinantes, fotossensibilidade, perda de 70% da coordenação motora fina (“não, eu não errei minha boca, o garfo é que tá torto!”), indisposição para tarefas mentais (acordar já é um ato de resignação) e completa recusa às tarefas físicas (“eu sei que estou a seis horas assistindo a esse programa mudo sobre os desenhos que o vento faz nos campos de açafrão, mas você queria que eu me levantasse daqui pra pegar o controle remoto?!”). Os reflexos psicológicos perpassam um mau-humor aleatório – semelhante à TPM – e calores – semelhantes à menopausa –, o que fundamentou teorias segundo as quais o estado de ressaca seria uma incursão química à psique feminina. A tese foi fulminada ao se constatar que uma tigela de sorvete de flocos com cobertura de chocolate quente, apesar de atenuar o sofrimento, não reverte o quadro geral.

Li em algum lugar que os grandes vilões são os aldeídos. Passei a pedir minha cerveja sem aldeído, mas não parece ter funcionado. Também já ouvi falar que não se podem misturar destilados e fermentados. Pedi para pararem de colocar cachaça no meu vinho, nada. Diante da impossibilidade de se a evitar, passei a me preocupar com outro aspecto da ressaca – aquele que, para mim, precede a todos os outros e constitui sua verdadeira causa e essência: o aspecto moral.

Podem dizer que aquele amarelado nos olhos de ressaca é resultado da bile ou o que quer que seja, eu continuo achando que é culpa. Pode ser pelas memórias enevoadas da noite anterior, em que você tentou insistentemente beijar a mesma menina achando que o fora era só provisório. Você recorda, então, que na hora julgou estar recebendo sinais claros de que ela estava atraída por você – agora percebe que ela te pediu para parar de fumar não por se preocupar com a sua saúde, mas porque era proibido, dentro da boate. A cada caco de lembrança, a cada nova peça do quebra-cabeça, um novo sintoma físico. Minha tese terá sido corroborada se, na próxima vez em que encontrar aquela garota, ela vier te perguntar “e aí, ainda precisa de ajuda para escolher o nome do seu pônei” e você, sem idéia de por que teria dito aquilo, desmaiar.

Acho que o único jeito digno de combater a ressaca é suportando-a estoicamente até o fim. A dor é a punição merecida pelos excessos da véspera, quer você se lembre deles ou não. Ainda que doa tanto que você tenha vontade de chamar a polícia. Tylenol é para os fracos; engov, para os mal-intencionados.

Sorvete de flocos, vá lá. Mas sem cobertura.

1 comment:

Anonymous said...

Odeio quando seu blog me boicota!

Uma vez me contaram que existem tres dores que os seres humanos, fatificamente, conheceriam antes do suspiro final. As dores seriam uma forma de progresso (ou seja la o que for) espiritual. Seriam elas a dor de cotovelo, a de um pe na bunda e de chifre na testa.

Depois de ler esse post ate arrisco sugerir a adicao de mais um item nessa lista, a ressaca moral!

Como eu ja disse "ressaca faz mal mas faz pensar!"

E poxa, nao gostei da parte do ponei!! Discutir o nome desses sublimes animais e uma arte!


Ps: Alguem me disse uma vez que eu podia ter um ponei no meu Eden! Lembra? Provavelmente nos divertiriamos escolhendo um nome pra ele. Portanto, nao se envergonhe caso alguem venha com esses papos... Caso te perturbe, pense que sao apenas pessoas sem profundidade!

E isso.
Pamplemousse.