Monday, November 26, 2007

Revolução astronóica

Astrologia de boteco é uma ciência tão inexata quanto a capacidade de dicção dos bêbados que a praticam. Mas, ainda assim, como toda picaretagem milenar, pode ocupar horas de pensamento infrutífero ou pelo menos render boas conversas.

Uma amiga – taróloga, numeróloga, freqüentadora esporádica do terreiro do Pai Tião e católica de formação ecumênica – tentou me convencer outro dia quanto à cientificidade da astrologia. Despejando mais cerveja no meu copo (talvez tentando quebrar com álcool o meu ceticismo), ela argumentou que os efeitos dos astros na vida das pessoas eram constatáveis, por exemplo, pela influência das fases da Lua nas marés. O corpo humano, formado em 70% por água, também sofreria influências semelhantes. Respondi que se nós sentíssemos, de forma comparável, a força gravitacional de uma pedra enorme que gira a pouca distância do significativo volume de água que são os oceanos, precisaríamos nos amarrar, nas noites de lua cheia, para não sermos tragados para o espaço. Ligeiramente ofendida ela mudou de assunto, e passamos a debater as representações perniciosas da carta do Enforcado nos baralhos medievais.

O que sempre me incomodou é a possibilidade aventada pelo zodíaco de se classificar toda a humanidade em 12 categorias gerais. Sei que a astrologia séria não é simples assim, que existem os diferenciais dos ascendentes, descendentes, efervescentes, condescendentes e etcétera – mas, ainda assim, são os signos que dão a tônica das interpretações astrais de personalidade.

Se os astrólogos estão certos, me espanta que ainda não se tenham tomado certas providências. Por que não promover um estudo associando os feriados nacionais à índole dos povos em cada país? Dessa forma, para direcionar uma nação em uma determinada direção psicossocial, bastaria reorganizar o calendário.

Vou tentar explicar melhor: no Brasil, o grande feriado sexual é o carnaval, em fevereiro. As cópulas carnavalescas produzem um grande número de nascimentos em novembro – período dominado pelo signo de Escorpião. Segundo o perfil astrológico da Folha de São Paulo, Escorpião “é um signo magnético, de força animal, ligado em sexo, dinheiro e poder – os três grandes temas que movimentam a humanidade desde sempre. Nesses três campos, dá lições a todos (...) Chega a ser autoritário nesse seu esporte preferido de alcançar o poder”. Sem dúvida, isso explica muita coisa sobre o brasileiro.

Se transferíssemos o carnaval para o mês seguinte, ou para abril, teríamos mais capricornianos, no Brasil. Ainda de acordo com a Folha, a tarefa desse signo é “melhorar as estruturas existentes. Capricórnio resiste às frustrações, se submete às condições inóspitas para realizar um plano ambicioso de longo prazo e deseja ter o reconhecimento social de seus méritos. Seu jeito leal e determinado, seu temperamento confiável, sério e responsável, mostra segurança no que faz. Observador, Capricórnio despreza a bajulação e o servilismo e não cede ao seu orgulho ferido”.

Se desse certo, a veracidade da astrologia estaria comprovada em definitivo: seria a revolução. Passaria a ser proibido por lei fazer filhos sem antes determinar o mapa astral do guri. Medidas preventivas seriam adotadas para reduzir os atritos sociais ao mínimo inevitável, como por exemplo a de colocar Leoninos e Taurinos para estudar em escolas separadas e evitar assim os conflitos de personalidade entre esses signos ególatras.

E eu poderia finalmente admitir que fico meio nervoso quando leio no jornal que meu dia vai ser uma merda.

1 comment:

Anonymous said...

Adorei!
Mas como jornalista, você deve saber que a maioria dos horoscopos de jornal são fabricados pelos estagiários ou funcionários não-exemplares do mês (não desmerecendo as duas classes). Nada que deva ser muito levado em consideração, né?

De qualquer forma eu tenho um ceticismo curioso em relação a esses assuntos. Confesso que o meu maior medo é saber o que vai acontecer e basear minha vida inteira no que a pessoa falou, mesmo que por vezes eu tente me fazer acreditar que isso nao passa de balela. Esse ano resolvi que pararia de querer descobrir que rumo as coisas tomariam através do quiroga.net e da mãe da minha amiga (a garota asmática, lembra?), mas é meio difícil né?

Fico por aqui.
Beijo.